terça-feira, 28 de julho de 2009

Quarto ensaio

Reminiscências e reflexão: direito em metarmofose.*


Lembro-me da minha entrada na Universidade e neste passeio pela vida se vão quatorze anos que não vi passar. Adentrei a Universidade no Curso de Direito, sedenta por mudança, sedenta por Justiça, com a vontade de mudar o mundo comum aos jovens idealistas que adentram todos os anos os bancos das faculdades de Direito neste país.
A Unijuí era um lugar que nos propunha ser diferente, fazer a "diferença". Uma proposta de Universidade, de reunião em prol da busca do conhecimento. Eu, que nunca sonhara estar numa Universidade, ali estava, vinda de escola pública, de família pobre, depois de tantos afirmarem, por anos, que era impossível à "nós" aquele espaço de saber.
Logo conhecia o professor de Filosofia do Direito que nos fazia a seguinte pergunta: Que é Direito, que é Justiça, que é Democracia? Lembro que me foi dado ler o livro de Roberto Lyra Filho (Que é Direito), onde ele tentava definí-lo como sendo: “...............” (o que ele é mesmo (?)).
Inquietação, dificuldade de entender o que nos propunha o professor (a mesma inquietação que hoje vejo em meus alunos)... nossas bases foram rompidas e desde então nunca mais fui a mesma, tive de rever as teorias em mim enxertadas ao longo dos meus 21 anos de então.
Passo seguinte, fui apresentada ao livro de Roberto Aguiar que parecia responder a pergunta sobre o que é Justiça e passei a estudá-lo, vendo como ele brilhantemente definia Justiça como sendo uma bailarina que ora dançava com os poderosos, ora com os miseráveis, num balé estranho cuja profundidade me escapava a percepção. Também tentei conceituar o que seria direito em sua obra#, e descobri que ele anda junto com o poder e a opressão, mas que ele poderia simbolizar um espaço de libertação.
Aos poucos, me apresentaram Hobbes, Locke, Rosseau, Monstesquieu, Platão, Aristóteles, Maquiavel, Kant, Kelsen, Bobbio e tantos outros... tantas estrelas agora abrilhantavam meu obscuro céu, sedenta de conhecimento, bebia da taça que me serviam com a gula de uma criança. Por fim, certo dia me chega às mãos um texto de Warat... um descortinar da realidade, um rever a linguagem, os símbolos, a vida... um descortinar de uma nova possibilidade de análise, hermenêutica. Warat foi paixão a primeira vista, ao primeiro texto. Mas o direito alternativo, em voga, também nos apaixonava. Assim, cruzei cinco anos na velocidade jamais imaginada por mim e quando percebi, me formei, alternativa, em meados de 2000.
Após algumas leituras, me descobri garantista, e depois disso, me surpreendi resgatada por Warat, mensurando a possibilidade de um movimento surrealista no direito. O direito, como até aqui pensando, foi incapaz de resolver velhas questões, e outras novas despontam buscando respostas.
Através dessa pequena catarse, o que se vislumbra é a constante possibilidade de mudança: a metarmofose. Assim, também o direito precisa movimentar-se.
Ideal do direito é que seja emancipatório e não mais, legitimador de uma ordem jurídica. Eis a perspectiva Waraniana.
Passamos muito tempo discutindo com duas dimensões tradicionais de direito – jusnaturalismo e juspositivismo que a partir da Segunda Guerra mundial entraram em crise, ante aos efeitos dos massacres de então. Em termos de refinamento teórico essa crise se apresenta nos anos 70, pelas tentativas de explicar o mundo do ser pelo mundo do dever ser.
Ao mesmo tempo reaparecia o ante-positivismo resgatando a pricipiologia e os valores contidos nas regras. As antinomias precisavam ser resolvidas e usamos critérios de ordem pratico-tecnologicas para tanto.
Quando apareciam dilemas onde valores fundamentais apareciam em conflito e precisavam organizar a dogmática constitucional contemporânea – neo-constitucionalismo (as normas só dizem o que alguns leitores dizem que as normas dizem). Arbítrio de decisão não é arbitrariedade. Surgem as discussões hermeneutico-consitucionais.
O verdadeiro fundamento da norma surge das expressões sociais, no diz Warat. As antigas discussões de pronto estão ultrapassadas pela história. Nos últimos 20 anos no mundo todo, demosntramos a carência dessas respostas as questões que se apresentam.
A velocidade da globalização deságua também na globalização da responsablidade, devido a velocidade das informações. Na visão Waratiana somos responsáveis pelo mundo, pela humanidade. Pela facilidade de transporte, a migração aumenta e os valores circulam com maior velocidade no mundo, estas pessoas são portadores de valores subjetivos próprios de suas origens que aumentam a diversidade de alteridade no mundo.
Como fica a questão da igualdade, se somos diversos. Estamos dispostos a defender a igualdade quando a igualdade corresponde o direito a diferença?
A realidade nos confronta com inúmeros processos contraditórios, (global, local, diversidade e homegeneidade... etc) e constantes crises das representações politicas como bem diz Warat. O social não é natural, a realidade não é materialidade certa, é sentido, símbolo (significação agregada de sentido), artefato construido pelo homem, historicamente e de forma intersubjetiva, carregadas de contextualidade, de hegemonia.
Precisamos construir uma nova teoria do imaginário. Para tanto, necessário conjugarmos uma ação descrita na frase repetida pelo Teatro Mágico: "Os opostos se distraem, os dispostos, se atraem". Sejamos nós, atraidos por uma proposta construtiva de uma nova realidade.

* Wollmann, Andréa Wollmann.



"Sintaxe À Vontade
O Teatro Mágico
Composição: Fernando Anitelli

Sem horas e sem dores
Respeitável público pagão
a partir de sempre
toda cura pertence a nós
toda resposta e dúvida
todo sujeito é livre para conjugar o verbo que quiser
todo verbo é livre para ser direto e indireto
nenhum predicado será prejudicado
nem tampouco a vírgula, nem a crase nem a frase e ponto final!
afinal, a má gramática da vida nos põe entre pausas, entre vírgulas
e estar entre vírgulas pode ser aposto
e eu aposto o oposto que vou cativar a todos
sendo apenas um sujeito simples
um sujeito e sua oração
sua pressa e sua verdade,sua fé
que a regência da paz sirva a todos nós... cegos ou não
que enxerguemos o fato
de termos acessórios para nossa oração
separados ou adjuntos, nominais ou não
façamos parte do contexto da crônica
e de todas as capas de edição especial
sejamos também o anúncio da contra-capa
mas ser a capa e ser contra-capa
é a beleza da contradição
é negar a si mesmo
e negar a si mesmo
pode ser também encontrar-se com Deus
com o teu Deus
Sem horas e sem dores
Que nesse encontro que acontece agora
cada um possa se encontrar no outro
até porque...

tem horas que a gente se pergunta...
por que é que não se junta
tudo numa coisa só?"

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