terça-feira, 5 de julho de 2016

Pesquisa em direito, axômetros pinguinizados, análises críticas e conclusões tendenciosas: como sobreviver ao holocausto e a seletividade de ideias e ainda assim, exercitar a reflexão?





(Andréa Madalena Wollmann, Advogada, Mestre em Política Social UFF, Doutoranda em Filosofia Jurídica pela Universidade de Coimbra, Bolsista CAPES DPE.)






Esse texto não tem o objetivo de ser uma espécie de guião de pesquisa. Também não tem intuito de demonstrar o caminho seguro por onde o pesquisador na área do Direito ou mesmo da filosofia jurídica deva se conduzir. A pergunta que move essa análise breve é simples: existe a possibilidade de uma pesquisa não tendenciosa no direito?

Não quero com isso desestabilizar as certezas e conclusões obtidas por pensadores sérios, debruçados em objetos jurídicos por anos para tecer seus comentários e considerações. Muito menos ouso aqui contestar o mister da cientificidade de seus métodos de análise que revestem suas conclusões do viés da verdade científica epistemológica tão em voga. Ao contrário, ou não, como diria Caetano Veloso, se permitirmos um pouco de ironia providencial.
Creio que o dizer a verdade tem sido a grande angustia social, e ao nosso modo de ver, cada ângulo de visão, mesmo o mais restrito é verdadeiro àquele que o emite diante da miopia com que conduz sua percepção e a pressa com que apura suas conclusões. No mundo do google então… O fato é que nunca antes buscamos tanto afirmar a "segurança de nossas analises" e nunca antes profetizamos tanto verdades tão antagônicas diante da interpretação divergente na leitura dos mesmos autores. Porque isso se dá?
Mesmo consultando Humberto Eco e tentando aprender como se faz uma tese, corremos o erro de cair naquilo que Warat chamava de senso comum teórico jurídico, ou o que refiro ser axômetros pinguinizados disfarçados de teorias científicas. E o jurista sabe muito bem ser conduzido por suas paixões de forma a perder o prumo da análise, buscando primeiro ter razão para depois racionalizar algo, tendenciosamente excluindo esse e aquele que discordam do seu ponto de vista, temos que reconhecer. E a partir de discursos muitas vezes baseados na falácia da autoridade, vamos repetindo irrefletidamente o senso comum teórico cristalizado e chamamos visões destoantes de parciais.

Pergunto: será que alguma análise em áreas do conhecimento que não se permitam a transdisciplinaridade a multidisciplinaridade ou a interdisciplinariedade e o pensamento crítico conseguem ser totais? Ou ainda, será que em algum momento conseguiremos compreender a totalidade de um objeto? E se assim o fizermos, por quanto tempo se manterão as conclusões apontadas em nosso método de análise? Talvez até que pelo mesmo método se aponte novo olhar sobre o mesmo objeto visto de um ângulo que ignoramos (quer voluntária, quer involuntariamente).

Pois bem, esse texto não pretende ser como já referi, o algoz das teses e conclusões de pesquisas apontadas. Ao contrário, louvamos quem ouse nos dias de hoje dedicar seu tempo mais as pesquisas que ao facebook, ao WhatsApp ou outra forma de repercussão e rápida veiculação do “conhecimento”.

Mesmo pensando em Marilena Chauí (e me perdoem o método de citação da ABNT, ignorado aqui propositalmente), em seus textos sobre conhecimento científico e senso comum, mesmo discorrendo sobre a importância do método na contraposição de ideias e conclusões ao invés da discussão infundadas dos achismos por aí, me permito dizer aqui, o que penso e não somente me basear nesse ou aquele autor. Carnavalizei como diria Warat. E nesse processo de carnavalização permito refletir sobre o que a cada momento presencio na academia. A exclusão e a absorção de literaturas ao sabor do modismo desse ou daquele Doutor nisso ou naquilo, ou daquele orientador ou ainda daquela corrente teórica admitida como suprassumo. A soberba do repasse de nosso ponto de vista sobre isso ou aquilo ao arrepio dos métodos de análise mais simples diante de outros objetos científicos (qualitativo, quantitativo, bibliográfico, documental, etc.). A auto promoção de egos e pontos de vista no campo do "saber". O me cita que eu te cito. O diz que me disse, tantas vezes, literal e visceral da epistemologia jurídica tendencial.

Talvez ao reconhecer nossa tendencialização teórica, eu, humildemente, parta aqui para uma nova proposta de explicitação de ideias mais adequada com a realidade de nossas posturas cientificas que, muitas vezes, escondem no véu dessa desculpa hermenêutica nossas posturas políticas, nossa visão de mundo mais à esquerda, mais à direita, mais ao centro, mais reflexiva ou apenas “papagaial” e irreflexiva, que tanto se propaga nos artigos que se ampliam pelo mundo dos livros coletânea, revistas “especializadas” em tudo e em nada, e mesmo, reportagens televisivas de “experts” que incutem ainda mais preconceitos aos desavisados do mundo. Frase grande, não?
E se Foucault já nos alerta para os discursos de poder. Se Freud nos posiciona ante ao mal-estar da cultura, também me permito eu, escandalizar-me e escandalizar ao leitor nesse desabafo de uma doutoranda em meio a sua pesquisa de tese. E mesmo que este não seja um texto científico se consideramos a especificidade do método de análise desposado, pode ser considerado uma boa peça literária.E que venham as críticas fundamentadamente redigida e sempre bem-vindas! Afinal quem sou eu para dizer tal coisa, não é mesmo?
Por fim, como sobreviver a mente reflexiva diante do holocausto, da seletividade e dos modismos doutrinais? Com percepção curiosa. De espinha reta onde o pesquisador olha o horizonte buscando, ao menos, refletir e ampliar sua compreensão do mundo em uma realidade que, como bem disse Sócrates, a filosofia ajuda a perceber que diante desse mar de incompreensão de teses compreendidas: só sei que nada sei. E como respondi outro dia a um professor da universidade de Santiago de Compostela a quem muito respeito, que me perguntava se eu era idealista e queria mudar o mundo, penso que as utopias construíram caminhos para novas realidades, os utopistas lançaram novas ideias, os revolucionários, lutaram e lutam por sua implementação e os pensadores devem perceber sua função social de reafirmar os compromissos com a liberdade e a fraternidade, assim, se por hora, não podemos mudar o mundo rapidamente, que ao menos não contribuamos para o resgate de teses sectaristas para que não voltemos nos mesmos erros do retrocesso dantes leviatânico, relembrando aos outros como foi difícil conseguirmos chegar a este ponto de debate, diante de séculos de holocausto e escuridão.

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